quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

A chave de ouro


A gente se perdeu no mesmo dia em que nos conhecemos. Naquele momento em que a simples coincidência de celulares iguais nos fizeram ter a nossa primeira conexão, já havia um sinal de que tudo seria diferente. Você poderia ser mais um dentro de um saco de nomes que eu ia soltando nesses últimos anos sem o menor sentido. Ou você poderia apenas passar algumas noites em minha cama e ir embora, sem deixar cicatriz, vestígio ou saudade.

Mas não aconteceu assim. Você simplesmente me fez acreditar em um sentimento que parecia conto de fadas para um menino que ainda encara a vida com uma dose de mágica. Você me mostrou que ainda é possível amar de forma sincera, pura e gratificante, sem medo de qualquer possível falha depois. Mesmo que parecesse falhar nas primeiras brigas ou que eu não fosse suportar nossas diferenças, nosso desejo de querer bem era maior que qualquer coisa. O problema é que está faltando uma peça para continuar montando o quebra cabeça depois que você foi embora.

Resolveram roubar nossa proximidade, esconderam de vez a chance de eu te tocar com carinho, sentir cada pedaço do teu beijo e o quanto é prazeroso nossos corpos juntos. Deixaram nosso amor quieto. Guardaram em uma caixa e nos deram duas chaves de ouro com um cordão amarrado escrito em letras pequenas, mas legíveis: "Cuidem bem um do outro. Quando não puderem mais cuidar, revelem-se inteiros e sinceros. No fundo, vocês nunca se perderão, apenas se entregarão ao destino de forma tão plena quanto o amor".

Estou aqui, segurando o cordãozinho que nos une sem saber exatamente o que fazer com nossa distância. Queria que só o amor bastasse. Que todas nossas lembranças sustentassem seu sorriso por aí, enquanto seu jeito torto e suas piadinhas retardadas aguentassem eternamente meus desejos por aqui. Olho pra noite e só peço que ela termine logo, que o sol chegue e com ele venha um pedacinho de papel para servir de guia. No fundo, a gente sempre sabe o que quer, só tem medo de deixar a chave de ouro e tornar-se incapaz de voltar para buscá-la.

Texto de Patrick Moraes

domingo, 4 de novembro de 2012

Simplesmente existe e basta


I can't take my eyes off of you.
Chris Mann

Escrevi nossos nomes esses dias no vidro do carro, embaçado pelo ar quente que nossos corpos insistiam em gritar. Escrevi porque simplesmente queria nossas letras mais perto, nossos nomes mais íntimos, nossa combinação mais rotineira. Desenhei também um coração no meio. Não era para nos separar, era para unir em um só lugar nós dois.

Noite dessas eu realmente senti que a gente estava conectado por uma energia que nenhum texto conseguiria traduzir. Foi a primeira vez que eu senti nossos corpos se pertencendo de tal maneira que os cosmos jamais poderiam duvidar que a nossa ligação seria para sempre. É, pra sempre e digo sem medo de que isso um dia acabe. Nosso amor se tornou real com as pequenices de cada fim de tarde em meio ao quase deserto de um carro e uma praça. Cresceu nos carinhos dos meus dedos em seu mão suada, no toque macio da sua mão em meu cabelo. Nosso amor é tão concreto que paira em cada sorriso bobo seu, em cada expressão de raiva que eu faço pelos seus abusos, em cada gesto impaciente que a gente esquece minutos depois de perceber que o nosso amor simplesmente existe e basta.

É assustador nos ver longe um dia. Se te sufoca a ideia, em mim soaria absurdamente dramático se eu fosse traduzir a sensação que meu peito sente. Você se tornou parte de mim, aquela tão preciosa quanto uma caixinha com a bailarina de ouro. Construiu lembranças, entrelaçou carinhos, pintou de amor cada volta enquanto eu simplesmente te permiti que abrisse uma caixa que eu mantinha fechada em segredo por alguns anos. Você me permitiu sentir de novo o quanto é grande ser especial e o quanto se perde ao se esconder.

Dentro de mim, você permanecerá grande. Quando você se for, você permanecerá intenso. E quando restar alguma dúvida, você lembrará que nosso amor simplesmente existe e basta.

Texto de Patrick Moraes

sábado, 29 de setembro de 2012

Espelho turvo



Cansei desse negócio de tentar ser bom.
Cansei dos meus retratos da falsa sensação.
SILVA.

Dizem por aí que ele tinha crescido. Ainda que usasse o mesmo humor ácido e alguns sorrisos amarelos para situações embaraçosas, ainda que tivesse mudado pouco seu guarda-roupa, ainda que gostasse daquele urso velho de tanto tempo que fica sobre sua cama. Ainda que o tempo trouxesse resquícios e ele tivesse tão próximo de atravessar uma linha imaginada e desenhada para fechar um ciclo, ele simplesmente se sentia pequeno.

Mais cedo, o viram em frente ao espelho, descabelado, rosto inchado, mas ainda sem rugas. O reflexo era turvo, cheio de imperfeições, parecia simplesmente ter perdido os óculos que antes o encorajaria para encarar qualquer coisa. Não sabia qual rua seguir, se quer um atalho o empolgaria. Ficou por horas ali, em frente ao espelho, esperando a insegurança passar para que vestisse de novo o personagem tão bem acabado e convincente que todos torciam no final de uma seriado qualquer. Insegurança vestida de amores quase tão bem resolvidos quanto os dias da próxima estação. Demorou de passar. Demorou de chegar. Desistiu por hoje e voltou para o macio de sua coberta em um dia que nunca conseguiria ser colorido ou preto e branco, apenas rabiscado em tons de cinza.

Dizem por aí que ele dormiu até que pudesse voltar à cena em tons de vermelho escarlate e com um sorriso tão mais ácido que seu humor. Até então, o espelho havia continuado turvo!

Texto de Patrick Moraes

domingo, 23 de setembro de 2012

Li



Uns chamavam de Alice, outros de Li (isso, duas letras apenas), mas a maioria apenas a conhecia pelo sorriso simpático e a atenção que sempre transbordava com o olhar. Cabelos curtos, magrela e bem alta. Se não era a mais desejada do colégio, era a mais interessante em suas palavras bonitas e seus escritos borrados, por vezes, de lágrimas. Lembro bem daqueles abraços com gosto de algodão doce e os beijos de chocolate. Era feita de cores e jamais conseguiu decidir uma delas para pintar um autorretrato.

Entrou para o teatro logo cedo, mas resolveu que gostava mesmo era das palavras. Sabia escrever o amor de tantas formas que, por vezes, ficava deformando corações cor de rosa só para não perder o costume. Dia desses apostou com o mundo que nada mais daria certo em seus romances construídos em jardins de jasmins e brisas com cheiro de campo. Sabia que era um jogo de aposta arriscado, mas ainda assim o fez. Decidiu jogar fora a boneca que mais amou durante os poucos anos que tinha e ir em busca de uma grande fábrica de fofoletes. Tinha certeza que nas pequenas caixinhas iria conseguir completar os seus sorrisos solitários de todas as manhãs e ser amada.

Ainda a vejo caminhando com vestidos floridos e um batom tão claro que torna-se imperceptível ao rubro das bochechas tímidas. Vi que abandonou a fita que carregou por meses no cabelo e agora simplesmente amarra os poucos fios de uma forma propositalmente desleixada. Quanto a aposta, dizem que Li perdeu, apesar da grande insistência. A boneca velha ainda continua embaixo da escrivaninha onde ela escreve pequenos poemas todas as noites e a crença em um final de contos de fadas ainda pode ser vista em seus rascunhos embolados sobre a cama.

Texto de Patrick Moraes

Conheça também Bento e Iara.

Esse texto faz parte da série
escrita exclusivamente para Esquinas.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Em uma esquina


If you're broke then I will mend ya
and keep you sheltered from the storm
Ed Sheeran



Vi você perdido na sacada daquele prédio de cor descascada ainda que fosse novo. Nossos olhares não se cruzaram. Éramos dois pontos paralelos, mesmo que eu puxasse a todo custo a minha linha para chegar mais próxima da sua. Lembro de ter descido do meu prédio, chegado bem perto do teu jardim, olhado pra cima e esboçado um grito que pudesse ecoar o meu desejo desesperado de cruzar nossas retas.

Dois dias se passaram e, dessa vez, você tinha puxado uma cadeira, olhado pra mim e sorrido. Talvez nem fosse um riso, fosse um mexer de canto de boca provocado pela minha insistência disfarçada de simpatia. É, costumo ser simpático quando quero unir pontos de uma travessia. Você foi adorável nos outros dias. Ainda não sabia seu nome, mas decorei o casaco branco que você usava para ir ao colégio e aquele penteado milimetricamente desajeitado. Todas as noites te via chegar, abrir a cortina do seu quarto e acenar, de longe, com os olhos que exalavam curiosidade e necessidade de afeto.

Não demorou muito para eu cruzar contigo na esquina do meu prédio, perto do seu. Pensei em fugir pela faixa de pedestre, mas o sinal fechou. Ainda tentei passar despercebido entre os carros, mas você segurou meu braço e riu. "Espera!". Já não sabia se me assustava mais com a buzina daquela kombi velha, com sua forma atenciosa de me tratar ou com o sinal que simplesmente resolveu ficar fechado por mais de um minuto.

Desisti de atravessar a rua. Descobri o seu nome. Soltei sua mão do meu braço e a segurei levemente forte. Era a forma de dizer o quanto as nossas ruas foram construídas para se encontrar em uma esquina. E se não fosse nessa, seria em outras dispersas em qualquer avenida, mas com tanto desejo, curiosidade e afeto que qualquer amor ficaria com inveja.

Texto de Patrick Moraes

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Chão de dúvidas



Cause I need you to look into mine.
Snow Patrol

Vieram partidas aquelas palavras. Por mais que parecessem brincadeiras em mais uma tarde comum, minha bipolaridade comportamental resolveu absorvê-las como indecisão. Perdi o chão de certeza que eu coloquei areia rápido para o mar não molhar. Não teve jeito, o terreno ficou fofo e um buraco enorme nos espera lá embaixo! Ainda estou aqui, em pé, me segurando em escoras imaginárias de medo que não consigo soltar.

Você veio na hora certa, mas talvez seja alguém ainda mal acabado. Com tantos traços bem acabados em sua escultura, os detalhes internos se mostram opacos, sem luz, necessitando de coragem para abrir um pote de giz de cera e colorir. E enquanto você me cobra olhares e afetos, eu só queria entender o motivo de ter me virado aquela noite e resolvido mudar a condição que me impus por longos três anos. Intensos três anos!

Talvez você não perceba que sua estrada começa aqui, mas você não precisa me mostrar que pode seguir sozinho ou na companhia de outros passageiros ao seu lado naquele ônibus que passou em nossa frente. Você só precisa abrir a porta do carro e ir embora. Minha oferta de te levar dentro do meu carrinho vermelho talvez possa ser por pouco tempo e em outra rodovia qualquer a gente possa se perder por incosequência do destino. 

Enquanto a estrada for estreita pra você seguir de mãos dadas a minha, é mais seguro ir a pé. Enquanto você achar que outros podem ocupar o banco do seu lado, é melhor desistirmos de embarcar nessa viagem juntos. Enquanto você não me convencer que podemos ser bem mais do que somos, o chão de areia ainda estará molhado de dúvidas e histórias mal acabadas pelo último verão.

Texto de Patrick Moraes

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Com remetente



"Eu você e todos os encontros casuais. Os ais e os hão de ser e todos os casais... Tudo passa."
Marcelo Camelo

Quero você do meu lado, como aquele dia no sofá, com a luz apagada e um pequeno brilho que vinha da varanda em nossa frente. A gente já não era mais os mesmos. Você continuava cheio de beleza, com aquelas conversas bobas e aquela intensa pirraça que ainda me fazia te olhar torto, mas cheio de vontade de rir. Eu já não te queria como antes, eu te queria como nunca tive, de braços fechados e salivas trocadas no meio da noite com outro qualquer. Outro que jamais teria nome ali, era impessoal e sujeito comum, que não completa sequer uma oração, quanto mais formará aqueles longos períodos que a gente escreveu.

Sim, eu ainda tinha ciúmes. Mas não era aquele desejo excessivo de matar alguém porque você fazia parte de mim. Era o gosto amargo de ter te perdido, de ter aberto mão, de sentir alguns grãos de areia escorrer pelos dedos. Lembro que desde pequeno eu achava que poderia segurar toda a praia com apenas um aperto de mão. Nunca gostei de baldinho e sempre construi meu castelo sozinho, mas chorava ao vê-lo despedaçar com a onda por não ter ouvido meus primos berrando que o lugar estava errado. 

Desisti de acreditar que eu era capaz de segurar tudo em minha mão. Fiz birra, chorei, resolvi mergulhar no mar e voltar limpo, de alma lavada, mas o coração ainda se mostrava fechado pra você. Se eu voltar um dia para aquele sofá, me despeço com um beijo, dessa vez com gosto de carinho, como nunca perdemos um pelo outro. Dissolvemos, decerto, em outros sentimentos azedos, instingantes, desejados por uns, mas que nunca vingaria pra sempre. Se nosso amor não vingou, por que nossa eterna briga de casal separado vingaria? E que fique a ternura, o beijo na mão de cada encontro nos fins de tarde e os doces que sempre nos fizeram mais amigos.

Texto de Patrick Moraes

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Ainda



O nosso amor parou aqui
E foi melhor assim.
Nana Caymmi

Ainda tenho nossa foto salva na área de trabalho, ainda me incomoda a proximidade dos nossos corpos, ainda lembro de você quando me mostram aquela música, a mesma que ouvi com você e suportei por você. Ainda não sei explicar o que aconteceu nesses quatro ou cinco meses de um ano que começou estranho, em alta rotação e ao mesmo tempo calminho. Ainda sinto um desejo interminável de que você desapareça, de que a gente nunca mais se veja, de que as recordações sigam juntas nessa mala que arrumei com um pouco de carinho e muito de entusiasmo. Ainda me pego acordando de madrugada e sentindo a cama fria do outro lado, naquela coberta verde, do lado do urso que segurou outro dia a almofada rosa. Ainda olho para as letras daquela almofada e questiono o quanto foi amor e o quanto foi farsa. A farsa que sustento até na dor, até no sofrer. E se for farsa, convenceu tão bem que machucou de verdade. Ainda choro quando percebo a bagunça que você deixou assim que saiu correndo e resolveu abrir a mesma mala que eu arrumei pra você ir embora. Não deu tempo catar as peças que iam caindo, os retratos que foram sendo pisoteados, as migalhas sufocantes em forma de lágrimas. Ainda sonho com os olhinhos pequenos, os mimos e os dramas, só que em outro rosto, outro toque e outro corpo. Ainda brinco de ser soldado de guerra dizendo que não foi nada, apenas uma batalha que acabou. Ainda me faço de menino grande e esqueço das pequenices guardadas em cada sintoma que deixo escapar despercebido, relaxado, em transe.

Ainda digo adeus. Ainda sinto o adeus. Ainda sonho com o adeus.

Texto de Patrick Moraes

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Olhares ávidos


I'm done with my graceless heart, so tonight I'm gonna end it.
(adaptado de Florence + The Machine)

Cansei de pontos e vírgulas que se tornam reticências com o derreter de um pingo na caneta de tinteiro. Parece que os fragmentos de amor se tornaram tão pequenos que se afastam, como poeira em meio a um deserto de olhares ávidos por um final de novela das oito. Já não me interessa saber todos os teus sujeitos, teus períodos, ainda que eu esteja aqui enchendo um texto só meu de orações sem sentido, em um fim de domingo, em um fim de uma ligação que perdura mais do que deveria.

Entre palavras trocadas, uma desculpa. Entre olhares trocados, uma perda. Entre aquelas (in)verdades ditas, uma maldição. A maldição capaz de transformar o que antes era belo em um simples espelho quebrado, com cacos que feriram. Por sorte, corri; e o que todos os olhares - dessa vez, ávidos por sangue - desejavam, não foram capazes de gerar mais que arranhões. Ainda aqui, sobre a pele, as marcas me fazem reviver sensações e olhar para um escuro tão mais claro quanto seria capaz de enxergar.

Um entremeio. Grades. Um aqui tão apertado que tonteia, nebula.
- Saia. Voe. Busque sua liberdade. Só nunca esqueça: a intensidade jamais será a mesma se não for (tão) alto. Aqueles olhares ávidos? Ainda estão te olhando, cá de baixo, para que não saia de tão perto deles, ainda que te faça subir por vezes em um espaço tão raso quanto aquilo que nos tornamos.

Texto de Patrick Moraes

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Ainda aqui



Will our memories survive?
Whitney Houston

Já não sei se o desejo veio logo de manhã, quando acordei e não te vi mais do meu lado, ou a noitinha, quando ainda olhava da janela do meu quarto aquela hora em que você me abraçou tão doce que eu pedi pra ser eterno. Mesmo que passe durante o almoço, mesmo que eu esqueça os toques momentaneamente enquanto outros copos e outros gostos me tomam, o desejo sempre retorna em uma velocidade descompaçada incapaz de deixar meu coração acompanhar o ritmo bumerangue de tudo isso.

Sentei na calçada ali perto e pensei em ver tua bicicleta parada no muro, aquele mesmo que você escreveu "você é o amor que eu vou levar para sempre". Eu sei, cada palavra veio em inglês e bem pequenas, como pedaços de cupcakes com confetes tão coloridos que não fui capaz de devorar tudo. Igual ao nosso amor, igual aos nossos carinhos. Ainda que intensos, nunca foram capazes de ser entregues completamente. Preferiam doses homeopáticas, pacientes, delicadas. Preferiam viver um jogo de conquista com restrição para adultos práticos e crianças ainda cegas de amor.

Hoje, quando me perguntam sobre nós, apenas digo que no fim, seremos nós. Ainda os mesmos tolos apaixonados que um dia acreditaram no felizes para sempre, sem se dar conta que toda grande série de sucesso precisa de hiatos para criar expectativa.

Texto de Patrick Moraes

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Quem disse que amores precisam ser pra sempre?



If you love me, I'll make you a star in my universe
Angus & Julia Stones

Não, amor não é eterno. Amor é estado de espírito, é intensidade que se vive talvez uma, duas, três vezes. Não é banal, mas passa longe de ser tão complexo como muitos murmuram e lamentam pelos quatro cantos da vida. Amor a gente até pode escolher na esquina virando a avenida principal ou naquele bequinho que cortamos caminho sem querer. E quando a gente escolhe, amor vira platônico, vira romance escrito com fantasias e coloridos de sonhos.

Não, amor não é lobo mau que persegue corações de capa vermelha. Amor pode ser sete anões tão pequenos, mas tão adoráveis, que é capaz de conquistar o coração de um menina tão branca quanto a neve. Amor é conto de fadas ou uma simples prosa mal contada, jogada letra a letra em um bloco de notas no fim da noite. Amor só não pode ser um fardo, carregado e impresso nos letreiros dos famosos outdoors virtuais para virar motivo de compartilhamento.

Amor não é jura de até que a morte nos separe, muito menos promessa de viver felizes para sempre. Amor é discutir, é ter ciúmes, é querer matar sufocando cada milimetro de raiva que simplesmente o próprio amor te fez passar. Amor nunca será um pote de nutella entregue de presente em pleno domingo de manhã, na cama, com beijos. Amor é sentar depois de um dia torturante e dividir o pote de nutella, mesmo que depois os dois estejam entregues no tapete, dormindo.

No fundo, amor não é definições. Amor é sensações, que você jamais poderá entender.

Texto de Patrick Moraes

terça-feira, 27 de março de 2012

Novos poemas de amor




E se foram os velhos textos, os sentimentos castigados e amadurecidos com o passar daqueles dias. Alguns exautivos, outros absurdamente prazerosos. Remoí alguns momentos, mas decidi que agora só teria novidades. Andei por mais alguns metros, me distanciei e olhei pra trás menos impaciente e mais cuidadoso.

Talvez eu tenha demorado de escrever a carta final, o parágrafo que soasse melancolicamente uma despedida, a frase que arrematasse tudo que foi vivido. Beijos e lágrimas podem definir algo que não me tirou do chão, apenas me deu vôos rasos. O legal é pensar que os velhos poemas de amor, que ainda estão sobre o banco de uma gangorra, me deixam absurdamente entusiasmado em tê-los de volta. Engraçado sofrer pela falta do sofrimento, gritar pela falta de confusão, remoer pelo que hoje virou vazio em meio a explosões de outros tempos.

Sentei no banco de madeira logo ali, no meio da confusão, e revi os pedacinhos de papéis que fui guardando na bolsa, antes de atirá-la ao mar, em um pedido de conforto. E se algum minuto dos próximos dias eu sentir saudade daqueles pedaços escritos à mão, lembrarei que estarão tão apagados quanto minhas aflições. Saudade fica, saudade vai. No fim, quero sentir falta daquilo que ainda não veio, daquilo que ainda não senti, daquele que seja pelo menos um vazio cheio de novos poemas de amor.

Texto de Patrick Moraes

cheio de vazios
que transbordam
seus sentidos 
pelo meio.
Paulinho Moska


sábado, 10 de março de 2012

Doce menos doce



So we keep waiting on the worldto change?
adaptada de John Mayer

Cansei de levar a banho maria uma sobremesa que simplesmente caramelizou. É, derrete toda hora e não consigo entender o ponto certo de tirá-la do fogo. Talvez não seja uma sobremesa a melhor metáfora que trago. Talvez nenhuma comparação consiga ser tão próxima de um bicho estranho chamado ser humano. Olho pra gente e vejo simplesmente dois momentos tão distantes que qualquer um com as lentes apuradas ririam dos dois macaquinhos que brincam de ser feliz. Nossos sorrisos são sincronizados, nossos beijos torturam qualquer olhar, mas nossos passos talvez sigam trajetos tão diferentes que está ficando complicado continuar de mãos dadas.

Não consigo viver daquele romantismo exagerado, daquele amor jogado aos seus pés. É piegas pra mim! Os motivos de pensar assim talvez sejam até mais piegas, mas é o passado. O tempo cura, mas não leva a cicatriz. Clareia, esconde, faz esquecer, mas se tornou tatuagem. Priorizar algo é como ter um filho, é querer mais que o mundo, ou simplesmente querer o mundo dando certo com aquilo. Não me venha com crises de romantismo, ora pois! Me venha com crises de afeto ou não venha. Se isso não te basta, que paremos. Nada mais me apetece como antes. Pra constar, ando mesmo é enjoado de tantos doces e tantas formas caramelizadas. Pimenta, cadê?

Texto de Patrick Moraes

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Pequenices


Cruzei o mar, estrada além,
tô aqui pra ver se ainda bate, pulsa.
Roberta Sá

De repente deu vontade de menos, começar em baixa velocidade e a pé. De repente eu só queria um amor pequeno, um desejo pequeno, uma cidade pequena e nada do que fosse grande faria meus olhos brilharem. De repente você seria capaz de tornar tudo mais simples, quebrar barreiras, sumir com toda essa bolha transparente que construi camada a camada com dor. Não, não dói mais. Hoje é apenas proteção, hoje é apenas maturação de vida necessária, adulta, uma espécie de remédio anti romances fadados ao fracasso.

Foi de repente que mudei de planos, olhei pra mim e disse que eu queria pequenices. Sorriso bobo de manhã bem cedinho, cafuné dengoso com os olhos sorrindo, com os beijos brilhando, com o coração andando tão rápido que parecia tropeçar a qualquer momento. Pão quente com manteiga, cueca jogada no chão do banheiro, lençol embolado na cama e água quente no corpo. Boas companhias em um lugar aparentemente pequeno.

De repente, olhei pra dentro e vi um coração pequeno. Um pedacinho do que já foi tão grande um dia, tão bobo, tão afetivamente disposto a amar em troca de um simples beijo. E mesmo que amar não seja só troca, e mesmo que amar seja estar disposto a, e mesmo com tantas definições subjetivas, caóticas e dramáticas em torno do verbo, eu ainda fiquei olhando pra dentro e achando tudo pequeno, do jeito que eu desejei. De repente, ser pequeno era ter crescido e toda aquela história da pequenice virou confusão.

E foi de repente que ouvi o pequeno gritar, assustado com tamanha pequenice: "Apressa o passo, esquece tudo jogado naquele quarto e simplesmente vive, menino. Amar? Na hora certa seu coração corre, deixa de ser pequeno e explode a bolha. Nessa hora, o aperto vai te contar baixinho o quanto ser pequeno deixará de valer a pena".

Texto de Patrick Moraes